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Victor E. Folquening escreve, você lê e diz alguma coisa

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Grupo de gestores para soluções estratégicas nas Faculdades Integradas do Brasil

quinta-feira, agosto 03, 2006

O AVATAR # 7! No fast food do Mal, o especial do dia é... seqüestro!

Episódio de hoje: “O Comodoro da Ala Sinistra – parte 1”


Rocky Ombro recebeu uma mensagem estranha pela internet, muito mais confusa que
as indecifráveis frases de Elizabete na parede da bolha. Dizia “findi td
dibom!!! skenta aki em kza” entre carinhas redondas sorridentes. O remetente era
alguém que assinava símbolos gráficos. Vamos chamá-la de “Srta. Asterisco”. A
velha sensação espiritual correu pela espinha d’O AVATAR quando leu o email.
Sim, aquilo era um desesperado pedido de socorro. A srta. Asterisco corria
perigo.

A situação era preocupante. Em primeiro lugar, nitidamente Asterisco precisava de um psicólogo. A mensagem não deixava dúvidas: ela estava sob terrível pressão. “Tenho medo que ela faça alguma besteira”. Mas onde?
“Que aparelho é esse, Cassius?”
“É um Rastreador-Grampeador-Canivete última geração, detetive. Com um pouco de paciência, essa belezinha consegue descobrir a origem dos e-mails”.
“O departamento resolveu abrir o cofre, hein?”
“Na verdade, ele apenas rastreia e-mails... Aqui está: a autoria da mensagem”.
miga_ju_fofis@absentmind.com
“Tem certeza de que não estamos lidando com alguma organização ou algo assim?”
“O rastreador diz que se trata de pessoa física, tenente”. Ombro ouviu a última frase com atenção. Isso descartava o “outro lado”. Ele sabe que no além as pessoas não são físicas.
“Teu brinquedo consegue descobrir o computador de onde saiu a mensagem?”
Cassius riu. “Ora tenente, isso já é ficção científica!”
Como Rocky Ombro previa. Mas ele tinha outros métodos para conseguir essa informação.
hh
Dona Neli faz massagens relaxantes, lê a sorte nas mãos e nas cartas. Ela comprou vários livros que ensinam as práticas de vidência, mas ficou com preguiça de ler um por um. Então, confiando na sua “vocação”, desenvolveu um método revolucionário.
“Vejo um homem na sua vida”.
“Em que carta?”
“Em todas”.
“Ah, então é aí que eles se esconderam!”
O interfone tocou e Dona Neli precisou deixar a mesa por uns instantes.
“Isso não quebra a corrente?”, preocupou-se a cliente.
“Não se preocupe, acendi uma defumação para fortalecimento das amarras. Especialmente para você”.
Madame Neli levantou o fone no meio do sinal de chamada.
“Ombro”, disse o interlocutor.
“Desculpe, mas só faço massagens na terça”.
“Rocky Ombro, mamãe”.
O detetive esperou cinco minutos para ser atendido. Dona Neli precisou terminar a sessão – alegou que não era conveniente deixar o espírito da Cigana Escrava esperando.
“As cartas dizem que você precisa tomar um banho de descarga com a erva churumaco do palanque sagrado”.
“Pra quê?”
"Vá. É melhor ir antes que anoiteça. O banho só tem efeito antes do Guatupé Roxo cantar”.
“Onde eu acho isso?”
“Numa loja que venda passarinhos”.
“Mas as agropecuárias fecham às seis”.
“Viu? Por isso deve ser feito antes das seis”.
“Você quer que eu tome banho de palanque na agropecuária?”
“A Cigana Escrava está me soprando no ouvido. Tem que ser assim. Senão seu homem não virá”.
“Pelada numa loja que vende ração pra galinha: com certeza vai encher de homem!”
Dona Neli disse então que precisava se recolher para liberar a Cigana Escrava. Ela colocou a mão nas costas, enrouqueceu a voz, se apoiou em uma estátua do Mago Gandalf e concluiu:
“Af, af, nega véia precisa vortá pras lida da otra dimensão, ajudá os gnomo e o véio Noel”. E mancou ora de uma perna, ora de outra até o banheiro.
Rocky Ombro, um homem cuja honestidade era abrangente como a camada de ozônio, segurou a cliente pelo braço.
“Ei, não vê que isso é uma farsa? Minha mãe está inventando!”
A mulher deu de ombros.
“E daí?”
Três minutos depois, a vidente massagista volta à sala; “Ela já foi? Não sei por quê, mas não confio muito naquela mulher”.
“Mamãe, eu preciso de sua ajuda. Sem truques”.
“Rá, vá pedir ajuda para aqueles veadinhos da tal perícia científica”.
“Você sabe que a ciência não resolve tudo, mamãe! Lembra quando eu tive vermes?”
“Diga o que você quer e talvez, se eu tiver um tempo, eu te ajude... mas não faça essa cara de vitorioso. Essa é a última vez, entendeu? A última!”
“Você é a melhor, mamãe! Eu gostaria de saber de qual computador veio a seguinte mensagem”, e mostra um papel com a transcrição. “Foi assinada obviamente com um codinome: miga_ju_fofis@absentminds.com
“Hmm. É um nome muito estranho. Preciso consultar meu livro de entidades”.
Ela vai até uma caixa de sapatos de palhaço, encima do guarda-roupa, e de lá tira vários panfletos de desconto em farmácias, a revista Zongo, a auto-biografia psicografada por Valêncio Xavier antes de falecer e o Livro Sagrado de São Bisonho para Entidades Proibidas e RPG, uma edição esgotada e perseguida pelo síndico supersticioso de um prédio na zona sul da cidade.
“Vamos lá: Conxuciferus... Contadores... Comodoro da Ala Sinistra... Achei: Com!”
Como de costume, Ombro tinha escolhido o ponto de partida certo!
“Com: Depois que Gelson Mendigo expulsou Indiomar da Ala Nobre do Castelo das Sombras, a Espada Cantante da Sabedoria Média caiu sobre a consciência de Celoí: esta a entregou para Comoeque, que passou a se chamar Com, para facilitar na lista telefônica”.
“Interessante. Mas não sei o que fazer com essa informação!”
Dona Neli se aproximou e olhou O AVATAR nos olhos:
“Vai saber. Ouça sua consciência. É o que vem fazendo desde que achei você naquela caixa de sapatos de palhaço, boiando no esgoto lá nos fundos”.
“É... já se foram três anos desde então, mamãe”.
“Puxa, o tempo demora tanto pra passar... que inferno”.
hh
Na volta para casa, com o cheiro nostálgico do outono se acomodando no horizonte, Ombro atravessou o sinal fechado duas vezes. Como dirige uma ambulância mal reformada, os carros deixavam-no seguir sem buzinar. Tentava juntar os cacos daquela história misteriosa.
Na única esquina que parou, encantado com uma menina que fazia malabarismo com UMA laranja, percebeu um letreiro em neon e seu astuto cérebro fez ding! “Como a Elizabete diz quando está agitada: ORROCOS!”
Era uma “balada”, mas não como "Love Hurts" ou uma canção do Brian Adams. Balada é uma boate rebatizada para não ser confundida com estabelecimento onde homens tentam usar dinheiro para transar com garotas e garotos vestidos jovialmente. Adolescentes muito maquiadas e seus namorados impregnados de quantidade tóxica de gel formavam uma fila na calçada. Pulavam no mesmo lugar e esfregavam os braços. “Será uma gincana?”, cogitou o detetive. O mais surpreendente, no entanto, era outra coisa:
O nome da balada era COMOéQUEé. “Mamãe tinha razão. A verdade apareceria para mim!”
Rocky Ombro vestiu o sobretudo amassado que herdara de Peter Folk, entrou na fila e até viu um conhecido dirigindo bem devagar ao longo da quadra. “Ei, Rocky! O que tá fazendo aí, seu pedófilo?” O AVATAR não poderia responder na frente de todo mundo nem chamar muito a atenção. “Vim encontrar a Elizabete. A danadinha adora um arrasta-pé”. E rebolou com uma mão no ventre e outra sobre a cabeça, estalando os dedos. O colega pensou na cena e perguntou onde a garota encarcerada na bolha estaria naquele momento. “Está vindo de ônibus. Tô guardando lugar na fila!”
Três horas depois, Ombro conseguiu entrar. Procurou o bar, o endereço da vida em que a verdade vem chacoalhada numa coqueteleira. Ei, ele conhece o garçom!
“Geraldino!”.
Depois de ser despedido da polícia supostamente por causa da numerologia, o experiente detetive, conhecido no passado como o Shaft de Romeniatown, passou por três empregos. “Dei muito azar, Ombro. No primeiro, disseram que não se fabricava mais uniforme do meu tamanho. No segundo, alegaram que eu sofria um encosto espiritual e no terceiro porque meu nome não rimava com o do chefe”.
Ombro não tinha estômago para manter uma mentira antiga. “Lopez não te despediu por causa dos números”. Geraldino parou de enxugar o balcão, como estava fazendo havia trinta minutos, e sua pele negra ficou pálida com a raiva que se avolumava no coração. “Na verdade, fizeram um SIASPR – Sistema Interno de Avaliação da Satisfação dos Presos Remediados – e os detentos reclamaram que você cozinha muito mal”.
“Eu não sei cozinhar. Foi o tenente Lopez que me colocou na cozinha para economizar! Além do mais, ele jurou que o SIASPR jamais cortaria a cabeça de alguém”.
Enquanto conversam, Cliceu Eduardo Alcântara Albuquerque Júnior, o dono do estabelecimento, chega esbaforido: “Ei, porque você não disse a raça aqui no formulário de emprego? Está insinuando que teríamos problemas em contratá-lo? Acha que somos algum tipo de árabe ou algo assim? Sinto muito, mas não precisamos mais de seus serviços”.
“Mas por quê? Eu preparo coquetéis, sirvo as mesas, estaciono os carros, faço vigilância e ainda ganho menos que a garçonete”.
“Você deve ter problemas psicológicos. Mania de perseguição. Não gostamos de gente assim por aqui. Atrapalha a harmonia do ambiente”.
“O que está havendo?”, perguntou Ombro, prejudicado pelo som do banda Thalia Cover e por uma briga entre dois freqüentadores que saíram para dançar com a mesma roupa.
“Eu vou buscar minhas coisas”, saiu desanimado Geraldino, pra quem a vida ia de mal a pior: até foi expulso do Clube dos Hemofílicos (“alegaram falta de condicionamento físico”).
O empresário esperou um segundo e confidenciou para Rocky: “Sabe o que é isso? Falta de uma boa orientação. É o que digo: a fruta não cai longe do pé. Você acha que esse aí tem bons exemplos em casa?”
Soa um ringtone do cantor Latino.
“É o meu... Oi, papai. Claro, 10h30. Eu levo a ceva! Te amo, paizão”.
Ombro bebericava a única e cara água de esgoto que serviam na espelunca.
“Veja, é o que eu digo: harmonia familiar. Hoje eu e papai vamos apostar numa rinha. Muitos homens tão aí, zoneando na rua bem longe da família. Papai não: sempre me leva. Família é a base de tudo”. E saiu, puxando o queixo para trás na esperança de evitar um arroto.
Nesse momento, Rocky Ombro correu os olhos pelo balcão e percebeu um brilho sob o pano que Geraldino havia deixado. Olhou para os lados e rapidamente embolsou o objeto. No banheiro, conferiu a “dica” que o ex-companheiro da polícia legara. Era um chaveiro com a letra G e uma única chave. “G? G...ah!” Cruzou com a garçonete peituda duas vezes melhor remunerada que o Shaft de Romeniatown: “Ei, boneca, sabe me dizer como chego à garagem?”, e colocou uma nota de R$ 2,00 novinha no decote da loira de sobrancelhas castanhas.
O AVATAR desceu furtivamente as escadas que levavam ao pátio dos carros. A noite estava saindo cara, pois precisou deixar R$ 0,65 em gorjetas para o flanelinha permitir alguns “testes”. Na oitava tentativa, um chevette marrom 1978 cedeu. Era aquele carro. Agora precisava descobrir uma pista qualquer. Não foi preciso procurar muito: no banco traseiro, um panfleto indicava o restaurante McDrakula.
Comida típica romena, dizia o pequeno cardápio.
“Romeniatown!”.
pp
No caminho, usando o automóvel indicado pelo ex-parceiro (“uma vez policial, sempre policial”, pensou com satisfação), Rocky Ombro recebe uma ligação do próprio Geraldino.
“Cara, me ajuda. Roubaram meu carro. Esqueci minha chave no balcão e não tenho coragem de recorrer ao Lopez”.
“Relaxe, colega. Agora eu não posso. Estou numa missão, lembra? Engula esse orgulho e fale com o tenente. Quem sabe não é hora de uma reconciliação?”
“Mas...”
“É melhor não conversar por essa linha. De qualquer forma, muito obrigado por ter armado o lance para mim!” E desligou, temendo os sofisticados equipamentos de rastreamento usados pela máfia romena.
Ali estava, passando o portal: Romeniatown. Ah, como Rocky odiava aquela parte assombrada da cidade. A horrível arquitetura dos restaurantes, imitando castelos da Transilvânia. Quando passava por um grupo de turistas posando ao lado de cemitérios temáticos, sentia vontade de vomitar.
É óbvio que existem motivos mais fortes para tanto rancor.
E eles precisavam aparecer logo agora?
Um boneco eletrônico dentuço havia emperrado na entrada do McDrákula. Emitia sem parar o velho riso sarcástico. Ombro se sentia como se fosse obrigado a assistir Kiss contra o Fantasma da Montanha Russa cem vezes seguidas.
A porta se fechou às costas d’O AVATAR e seus olhos petrificaram. Atrás do balcão estava a mulher que mais intrigou o detetive durante toda a vida. Aquela cujo mistério da existência desafia tanto sua paranormalidade quanto seu impressionante conhecimento de técnicas forenses.
“Elizabete?!”
“IAPAP IO!”, ela escreveu na bolha amarrada a uma capa negra com forro vermelho.
“Por São Bisonho!”, pensou Ombro, “o que fizeram com minha filha? Ela está falando romeno!”

(continua)

Na continuação: Elizabete, visivelmente hipnotizada, parece entoar uma oração satânica: “?MU OREMÙN O ATIECA”. Rocky Ombro tem uma suspeita: “minha filha e a srta. Asterisco seriam a mesma pessoa”? Um alçapão leva a uma entidade até então tida como lenda. Não perca: “O Comodoro da Ala Sinistra – parte 2”

1 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Sim, provavelmente por isso e

20/11/09 19:05  

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