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Victor E. Folquening escreve, você lê e diz alguma coisa

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Local: Curitiba, Paraná, Brazil

Grupo de gestores para soluções estratégicas nas Faculdades Integradas do Brasil

quarta-feira, janeiro 09, 2008

A MELANCOLIA DOS APARTAMENTOS MILIONÁRIOS!


Uma genealogia das letras coloridas:
Eu decidi que ganharia a vida escrevendo – de um jeito ou de outro – quando percebi as vitrines, placas, camisetas, gibis, cartazes e tudo aquilo que fosse decorado com letras, tipos coloridos ou sombrios; Naquela névoa da infância, me encantei com signos carregados de um profundo e literal mistério.
Quase tenho certeza de minha primeira experiência pública com leitura. Minha mãe me levava pela mão ao longo de uma calçada da rua Coronel Cláudio, em Ponta Grossa. Agora é um calçadão, mas no final dos anos 70 era o endereço de uma loja chamada O Azulão Alberto Ansbach e da fábrica da cerveja Antártica, casa da mítica Original.
Eu consegui decifrar as letras: CASA VITÓRIA. Parecia meu nome, que, aos quatro anos, é a primeira coisa que seus pais te ensinam (a não ser que você se chame Jawaharlal Nehru ou Juvenal Habyarimana). Fiquei exaltado e, empolgado para confirmar o diagnóstico com a dona Neli, virei meu rosto para frente e... um poste. Meu nariz jorrou sangue uns cinco minutos. Minha mãe é apavorada, mas eu era tão distraído (dezenas de cicatrizes!) que ela quase riu (acho, pois meus olhos estavam embaçados por causa da batida e o rosto dela, lá no alto, confundido com a luz intensa do sol e umas espocantes bolhinhas amarelas, poderia ganhar uns traços inexistentes... se eu fosse um argelino armado e ela, árabe, o final teria sido bem desconfortável).
Em outro momento da minha vida descobri um título. Não sei se foi num sebo ou num catálogo. O nome do livro era A Melancolia dos Fast Foods. Eu não sabia o que era fast food – e Ponta Grossa também demoraria uns quinze anos para descobrir. Escrevi um conto pensando no título e inscrevi num concurso de adultos. Para minha surpresa – e da comissão julgadora, da qual fazia parte Miguel Sanchez Neto – eu ganhei. Tenho os troféus até hoje (também fiquei com o terceiro lugar) e uma edição do jornal Ponta a Ponta em que “Numa manhã de escuridão” foi publicado.
Até hoje procuro A Melancolia dos Fast Foods pelos sebos. Muito antes, porém, vi um livro com reproduções de Edward Hopper. O quadro mais famoso, Nighthawks, parecia uma ilustração perfeita para meu conto, uma versão visual esplêndida para A Melancolia dos Fast Foods e um complemento in the mood para o sangue do meu nariz turvando o letreiro da Casa Vitória.
Há cópias de Hopper por todo o meu apartamento.
Mas eu já não acho melancolia uma coisa agradável. Deve ser porque aprendi o significado – e o vivi algumas vezes – e porque conheço perfeitamente a falta de charme dos fast foods.
Então minha aventura pelos apartamentos milionários de Curitiba não me deixou aquele ar de “Curtindo a vida adoidado”.
Domingo à tarde, quando passeávamos de carro, convidei a Priscilla a visitar uma “apartamento decorado” de um prédio pomposo em construção na Visconde de Guarapuava. Era um desses de “preço médio”: 900 mil reais. Dali em diante vimos outros três ou quatro mais caros.
O resultado final foi a melancolia. Mas não porque naturalmente não tenho grana para morar nesses lugares. É porque eu não fiquei com vontade.
O primeiro prédio: 190 metros quadrados e apenas dois quartos. São amplos, são bonitos, o piso de mármore é aquecido. Tem tv de plasma no banheiro. Mas algumas janelas são tão pequenas... Elas nem existem nos banheiros. Tem algo nas frestas das portas, tem algo grande demais, custoso demais, parece uma Xanadu sem importações exóticas.
O segundo apartamento: 1,5 milhão. Também na Visconde de Guarapuava, com vista para os outros prédios. 600 metros quadrados. Duas acomodações para os serviçais (que devem ser anões ou oompa loompas, pois não consegui entender como uma cama de adulto caberia ali). Quatro vagas de garagem. Na do vizinho, uma Ferrari amarela coberta com um cobertor vermelho. Ninguém na piscina, na churrasqueira, no salão de jogos, na academia ou na sala de chá. O apartamento é um labirinto. Banheiros demais. Sem janelas, a maioria. Uma grande hidromassagem no que descobri ser a Suíte Principal. Mas o vidro é totalmente canelado e ninguém veria o céu, o horizonte ou mesmo a chuva enquanto sentisse suas costas serem golpeadas delicadamente pela água.
O terceiro apartamento: 870 mil. Um duplex na Padre Anchieta. Janelas enormes que mostram o parque Barigüi. Tem um Itaú Personalitte embaixo, o que dá aquele ar Beverly Hills que as pessoas gostam (serviço caro com placa discreta e marmoreada). Quatro vagas de garagem. Sem janela no w.c. e uma banheira tão pequena que só serviria para o empregado-pigmeu. Tem uma piscina, bem rasa, mas uma coluna de enfeite, sobre ela, provoca a sensação de que teremos sol só uns quinze minutos por dia. A taxa básica de condomínio: 2 mil reais.
E pastilhas por toda a parte. Na recepção, candelabros sobre sofás que imploram pela sua aprovação. Cores “neutras”, paredes com tinta lavável e pinturas feitas sob encomenda por especialistas em arte abstrata para condomínios.
“Imploram”. A expressão é da Priscilla e cabe perfeitamente. Esses prédios caros de Curitiba, em sua maioria, “imploram” para parecerem chiques, elegantes, de bom gosto. Mas não saem da categoria tigerbuildings (essa uma expressão minha, resultado de uma expedição a um parque aquático no final de ano. O lugar mais tiger que já fui, excluindo noivados com “pedido da mão” e festas de quinze anos). As salas “íntimas” são imensas, os closets são imensos e tudo que é deliberadamente fútil é imenso – pois a intenção não é impressionar pelo gosto, mas pelo gasto. “Não temos público para impressionar pelo gosto”, diria, com razão, uma colunável desses prédios de 50 anos no Batel.
Então vem a segunda parte da expedição. Edifício Jardim Europa, quase na esquina da Bruno Filgueira com a Silva Jardim. Uau! Você precisa se cadastrar e registrar a impressão digital do seu indicador para atravessar o portão. Um ótimo corretor, Marcel, nos mostrou – ele mesmo meio sem fôlego – os detalhes desse apartamento de 680 metros de área útil e cinco vagas de garagem.
No hall de entrada, uns cinco metros de pé direito. Lá fora, nos ornamentos do jardim, são dez metros! A impressão inicial é um pouco decepcionante. Um espelho gigantesco, pinturas enormes e antiguidades legítimas espalhadas pela recepção. Mas elas têm placas! O nome da loja onde foram compradas...
Bem, mas o apartamento é enorme. Disse para o Marcel: “Vou transformar um desses quatro quartos em biblioteca”. Tolinho, ele pensou, e me levou até o cômodo que efetivamente foi projetado para ser biblioteca. Na Suíte Principal há um closet maior que a sala do meu apartamento e dois banheiros – um para o cavalheiro e outro para a dama (nas palavras dele). Uma sala de jantar deliciosa e uma varanda quase do tamanho do meu lar inteiro. Adega, sala de home teather. Mármore italiano. Uma sala bem grandinha só para a central de ar condicionado.
Descemos até a piscina. Duas, uma delas interna e aquecida. Mas não tinha ninguém lá, apesar de 11 dos 21 apartamentos já estarem ocupados. Não havia ninguém em nenhuma das saunas nem na academia. “Esse pessoal vai ao clube”, concluímos eu, Marcel e Priscilla.
O preço é até acessível: quase três milhões de reais, contando a decoração (dá para economizar um pouco trocando o mármore italiano por aquele piso vermelhão ou deixando assim, brutte). “Não existe empreendimento semelhante em Curitiba”, suspirou Marcel. Pelo jeito, não há mesmo. Outros lugares são caros, caríssimos. Mas têm pastilhamento, janelas pequenas, escravos-anões. O gosto, no Jardim Europa, é bem menos tiger que em outras construções. E você recebe seco. Decora do seu jeito milionário de ser.
Mas, no fundo, todos eles me soaram profundamente melancólicos.
E não é por causa do preço. Se eu fosse milionário, viveria muito bem, com certeza. É porque parecem faltar imaginação, repertório, charme para esses lugares. Tudo que pode trazer prazer de verdade (quarto, banho, biblioteca, adega e cozinha, principalmente cozinha) parece se reduzir em nome da pompa explícita e da triste sede de segurança. Salas de estar enormes, com lareiras amplas e decorativas enquanto o sol brilha esplêndido.
A primeira corretora que nos atendeu, Nádia, comentou que empreiteiras de São Paulo começaram a dominar o ambiente urbano de Curitiba. As da cidade foram minguando e por algum tempo simplesmente não havia opção de imóveis “bons” (quer dizer, de luxo) na capital. Melancólico.

11 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Não entendo como você deixou a oportunidade de comprar um desses "ap's" com seu salário milionário da UniBrasil!

Lamentável!rs

9/1/08 17:57  
Blogger Cidade repetida said...

Eu ri sozinha na minha pequena sala de trabalho, onde minhas coisas estão espalhadas pela enorme mesa que eu ocupo.
Foi como se eu visse você contando isso numa das aulas dos primeiros semetres de faculdade.
Impossível esquecer alguém que fala e escreve tão bem.
E com toda a certeza ensinou a única matéria que realmente aprendi nesses anos acadêmicos.

Feliz 2008.

9/1/08 18:46  
Anonymous Anônimo said...

Caro Victor, o livro Melancolia dos Fast-Foods é de autoria de Jean Marc Parisis. No site www.estantevirtual.com.br vc irá encontrá-lo em preços que variam de 5 a 12 reais, mais o preço do frete.
Esta dada a dica aproveite, compre e depois de ler me empreste.

10/1/08 11:20  
Blogger Escritório de Gestão Integrada said...

Roberto: o problema é que administrei mal o 13o: comprei umas propriedades em Cote D'Azur que se mostraram meio fora de moda. Agora estou com esse elefante branco...rs
Carol: gentileza sua! Certamente eu sempre saio ganhando com o que aprendo com meus melhores alunos.
E, Lucas! Você é esplêndido. Já estou comprando, nesse exato momento. Agora, toda vez que contar a história da minha vida, mencionarei a interferência providencial de Lucas Rufino!
Abraços

10/1/08 11:59  
Anonymous Anônimo said...

Ah, os apês do Monteiro Lobato sim, são escitantes. Ei, Vito, você ganhou o prêmio com o In the darkness morning.

10/1/08 17:27  
Anonymous Anônimo said...

porra, excitantes!

10/1/08 17:28  
Blogger Andressa Berkenbrock said...

Vá no apê da Pres. Taunay, qse esquina com a Vicente Machado.
Um por andar, qse mil m².

11/1/08 00:53  
Blogger Escritório de Gestão Integrada said...

Bntt: você precisa conhecer os apartamentos do bairro Novo Mundo...
Andressa: Finalmente! Era desse que eu precisava para começar minha sonhada criação de cavalos!
Eu já havia pensado em transformar um dos quartos do Jardim Europa em uma jaula e criar um casal de hárpias...

11/1/08 10:57  
Blogger Sheila Gorski said...

Adorei a parte dos oompa loompas!
E se o apart for grande o bastante dá para montar a creche do tio Victor...

11/1/08 18:11  
Blogger Andressa Berkenbrock said...

Harpias normais ou as da mitologia grega?
Sheila, imagine a criançada correndo e brincando com o casal de quarto de milha, que o Victor acabou de comprar, na sala? Ô beleza.. =P

11/1/08 19:48  
Blogger Escritório de Gestão Integrada said...

Sheila e Andressa: eu pensei em uma creche para animais de estimação, que dá mais grana e ajuda a pagar o condomínio.
Quanto às hárpias, falo daquele casal lá do zoológico - sou fascinado por aqueles bichos. Na última vez que fomos lá, tive a impressão que estavam empalhados. Tentei jogar uma telha, mas a grade não ajudava. Elas se alimentam de macacos. Acredita nisso? Macacos! Se eu quisesse hárpias da mitologia, também daria espaço para gnomos, anjos, espíritos e outras superstições.

12/1/08 01:13  

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