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sexta-feira, julho 11, 2008

BUDD BOETTICHER! ASSISTA!

Finalmente vi um filme de Budd Boetticher.

Dou um tempo aqui na série sobre musicais porque é como se um desejo antigo tivesse se realizado.

A Paramount lançou no Brasil uma caixa com filmes produzidos pela Batjac, a lendária companhia de John Wayne. No meio, Sete Homens Sem Destino (Seven Men From Now, 1956), dirigido pelo ex-toureiro Boetticher.

Você pode comprar cada uma das obras separadamente, ao custo médio de R$ 32,00.
Vale cada centavo. Ou o triplo.

A fama do filme não é imerecida. É o tipo de coisa que procuro no cinema e está cada vez mais difícil de achar.

78 minutos de um roteiro esplêndido, simples, despretensioso e, assim mesmo, cheio de camadas de interpretação. O homem do texto é Burt Kennedy, um camarada que foi herói de guerra, caladão e, ao que parece, o complemento do egocêntrico e amalucado Boetticher.

Os atores são perfeitos. Não é preciso falar muito de Randolph Scott, que faz o vingador silencioso em busca dos sete bandidos que mataram sua mulher. É o típico papel de Scott: honesto até a medula, sem nenhuma afetação. Um macho, sensível e distante, mas um macho do Oeste.

A mocinha é Gail Russell, que fez fama com No Rastro da Bruxa Vermelha e outro filme mais antigo, O Fora-da-Lei, ambos com John Wayne - um amigo de toda a vida. Uma vida bem curta, diga-se de passagem. Como Judy Garland, Russell se tornou alcoólatra por não suportar a pressão do trabalho em estúdio. Foi descoberta antes dos 18 e levada para Hollywood sem nunca ter cogitado ser atriz. A bebedeira fechou as portas para a garota, que chegou a ser considerada a mulher mais bonita do cinema. Aos 36 anos, amigos a encontraram morta, cercada de garrafas de vodca, num apartamento minúsculo e miserável em Los Angeles.

Mas o "cara" de Seven Men From Now é Lee Marvin, personificando um dos melhores vilões da história. É tão estranho que chegamos a gostar dele. Tem alguma coisa afeminada nos seus gestos, acentuada por uma echarpe verde escolhida pelo próprio Marvin. Por outro lado, não há dúvidas da sua masculinidade. O melhor de tudo é que aceitamos um sutil código de ética entre Marvin e Scott. Eles são inimigos, mas parece que Masters, o bandido, admira seu oponente a ponto de parar um instante antes da ação e assistir os pequenos gestos do cowboy.

Duas cenas estão entre as melhores coisas que já vi no cinema. A abertura: uma caverna em que dois bandoleiros se protegem da chuva. Scott chega e explica que está a pé (os índios roubaram seu cavalo para comer) e começa a falar do massacre de Palm Springs. Ouvimos tiros, mas a imagem já é dos dois cavalos, amarrados lá fora. Em seguida, vemos o mocinho montado em um deles e carregando o outro. Mais tarde, o equino sobressalente servirá para um acordo com os indígenas.

(Lembra um de meus diálogos favoritos, este de Era uma Vez no Oeste: três bandidos, montados, vão receber Charles Bronson na estação de trem. Dizem que vieram pegá-lo, mas a intenção, é óbvio, é matar o gaiteiro-atirador. "Parece que está faltando um cavalo para você", diz um deles. Bronson retribui: "Na verdade, estão sobrando dois").

A outra cena é a do diálogo na carroça. Mais tarde descobri que é a cena favorita tanto do roteirista Kennedy quanto do próprio Budd. Marvin se encanta por Russell. Ele percebe que o viúvo Scott também arrasta a asa para a mulher, casada com o (aparentemente) molengão que conduz a parelha para Los Angeles. Lee Marvin começa a contar uma história fictícia que é, ao mesmo tempo, uma "dica" que ele está percebendo o clima entre a mulher e Scott, uma forma de humilhar o cocheiro e uma belíssima cantada na dona. A tensão é tão grande que ficamos ansiosos para que acabe logo. Grande cinema!

Os críticos levantam, assobiam e batem palmas para o duelo final. Um triunfo da economia e, como disse um comentarista nos Extras do DVD, uma morte que mais parece um balé. "Ele realmente sabe como morrer", disse a respeito do camarada que perde o duelo.

Sete Homens Sem Destino (cujo título em português o confunde com o clássico Sete Homens e Um Destino, refilmagem de Os Sete Samurais - mas não tem nada a ver) é um filme honesto, inteligente, grande diversão, maravilhosamente escrito, dirigido e interpretado. Não tem frescura - sem câmeras lentas, zooms, p&b misturado com cores, travellings de um quilômetro ou qualquer recurso fácil de "estilo".

É um dos maiores filmes da história do cinema.

***

Não posso deixar de comentar as entrevistas com Clint Eastwood e Quentin Tarantino nos Extras. Eu acho Tarantino um mala e não tenho medo de dizer que ele não acerta faz tempo. Digamos, desde Pulp Fiction. O resto de sua filmografia é uma curiosa paródia de si mesmo, com grande momentos mas evidentes problemas de ritmo e narrativa. Uma espécie de M. Night Shyamalan, que, aos pedaços, sugere um cineasta genial. Mas quando vemos o todo, não deixa de parecer amador. Ambos são cineastas de dois filmes. Tarantino com Pulp Fiction e Jackie Brown. Shyamalan com Sexto Sentido e Corpo Fechado. Todos os outros filmes da dupla são legais, merecem ser vistos, mas lembram trabalho de escola. Deve ser por isso que os nerds adoram tanto os dois.

E quando você vê Tarantino, ansioso, cuspindo, falando pelos cotovelos, e do seu lado há o irônico e discreto Eastwood, sabemos muito bem qual dos dois é grande.
**
A foto lá no topo, da cena na caverna, é p&b, mas o filme é colorido, magistralmente fotografado por William H. Clothier, um camarada que aprendeu seu ofício com Jospeh von Stenberg.