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Victor E. Folquening escreve, você lê e diz alguma coisa

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quinta-feira, julho 12, 2007

BRANCALEONE DO MAL PODE FUNCIONAR!


Parece haver uma tendência, entre historiadores da mídia e repórteres investigativos, de procurar fatos isolados, momentos particulares, tomadas de decisão que acabam por explicar todo o contexto que viria a seguir.
Pelo menos nos best-sellers.
Um desses livros que se sustentam na relação entre intimidade de personagens e suas conseqüências gigantes é o indispensável O Vulto das Torres, de Lawrence Wright (Companhia das Letras, 2007). É um trabalho de investigação jornalística impressionante sobre as origens do pensamento radical islâmico e as costuras que resultaram nos despojos do 11 de setembro.
Além de tudo isso, é de rara habilidade narrativa. As 500 páginas do texto, redigida após cinco anos de apuração, parecem 50 graças ao estilo limpo e altamente informativo de Wright, repórter da revista New Yorker e co-roteirista do filme Nova York Sitiada (que não assisti). A fluência da reportagem, inclusive, me fez resistir a uma improvável série de conexões de vôo que me tomou um dia inteiro.
O que mais chama a atenção, no entanto, é a acuidade de detalhes nas descrições da intimidade de gente como Ayman al-Zawahiri (o “número 2” da Al-Qaeda e que ontem apareceu no noticiário ameaçando Londres), o agente do FBI John O’Neill e o próprio Osama bin Laden.
E como a patetice pode ter conseqüências monumentais.
Wright defende que as picuinhas entre CIA e FBI, incompetência administrativa e ciúme entre diretores impediram uma ação relativamente simples contra a conspiração do 11 de setembro. As duas agências possuíam informações que, se fossem compartilhadas, poderiam ter bloqueado o ataque ao World Trade Center.
Pior é perceber que a perigosa Al Qaeda e os diversos grupos terroristas também agem, na maior parte das vezes, com puro amadorismo, cometendo erros tolos e jogando dinheiro pela janela. Há muitas passagens que mostram incríveis ações atrapalhadas dos fundamentalistas.
Como essa, sem maiores conseqüências, mas muito representativa: “Num táxi da cidade, o choque abalou Fahd al-Quso, membro da equipe de apoio da Al-Qaeda que estava atrasado. Ele deveria ter filmado o ataque em vídeo, mas adormeceu e não ouviu a campainha do telefone, que o avisaria para que preparasse a câmera” (p. 351). O dorminhoco, que deveria registrar a explosão no USS Cole, ancorado no Iêmen, acaba, centena de páginas mais tarde, como personagem chave das investigações.
Pelo lado do FBI, Wright é convicto de que as pessoas mais talentosas e capacitadas para investigar e deter os ataques terroristas foram paulatinamente minadas pela mediocridade dos colegas, ávidos por assembleismos e cheios de “restrições morais”. O’Neill é o herói incompreendido da trama, uma verdadeira força da natureza que tinha contra si um apetite sexual mais tropical que norte-americano e uma certa rusticidade irlandesa que incomodava os burocratas mais “sensíveis”.
“Mawn se tornara o defensor mais ferrenho de O’Neill. Reconhecia que a excelência era inimiga de qualquer burocracia, e que uma personalidade forte era essencial no combate à rivalidade entre os órgãos e ao ciúme departamental, que solapavam a força de vontade até dos melhores funcionários. Era justamente esse tipo de pessoa que precisava ser protegido e encorajado. Somente assim, com um líder poderoso e visionário, uma burocracia sem entusiasmo como o FBI conseguiria realizar alguma coisa notável. O’Neill era esse tipo de líder. Ele transformara o escritório de Nova York no ramo mais eficaz do FBI, mas aquilo lhe custara caro, como Mawn aos poucos veio a perceber. O s inimigos que O’Neill acumulara em sua luta polarizadora contra a burocracia estavam doidos para destruí-lo, e agora ele fornecera um pretexto “ (p. 348-49).
As células terroristas pareciam longe de conquistar qualquer vitória, mas, mesmo enroladas nas próprias pernas e entregues a um canibalismo ideológico, conseguiram perpetuar o mais sonoro ataque da História. Em grande parte por causa da inevitável porcentagem de gente medíocre que qualquer departamento do mundo – de educação, esporte, saúde, governo ou espionagem – precisa acomodar.
O que nos faz pensar que não devemos, nunca, subestimar os grupos que fazem pressão para atrapalhar os projetos mais inconformistas, mesmo que eles sejam formados por pessoas mesquinhas, incultas e atrapalhadas.
De um jeito ou de outro, vão juntar adeptos desiludidos com o próprio destino, tentar várias vezes e, enfim, conseguir derrubar alguma coisa.
***

Sobre descobrir a origem localizada de certos fenômenos, tenho aqui minha tese a respeito do tipo de cantora que Madeleine Peiroux representa tão bem nos dias que seguem. Ouça o esplêndido Beauty and the Beat!, jóia de 1959 editada pela Capitol, que reúne a cantora Peggy Lee e o excelente pianista George Shearing. Além do melhor trocadilho em capa de disco de todos os tempos, ainda temos uma “Do I love you” que, arrisco dizer, supera a versão da Ella Fitzgerald. O lirismo provocante, farto nos melhores momentos da cantora francesa, está todo aqui, embalado pela voz de Peggy, capaz de passar a louca sensação de juventude e maturidade simultâneas.
E tem Shearing, cada vez mais meu acompanhante predileto. Ouça-o nas gravações com Mel Tormé, por exemplo. Humor e um ataque romântico, pleno, capaz de preencher todos os espaços da sala – como diria alguém muito mais entendido de música do que eu.

11 Comments:

Blogger Jean-Philip said...

Oi Victor! Também li e adorei O Vulto das Torres. Mas o que mais me chamou atenção no livro - além das trapalhadas dos serviços de inteligência - foi como pensamento radical islâmico nasceu e como governos árabes pretensamente ocidentalizados botaram lenha na fogueira. É muito esclarecedor. Adota o livro em classe! Abraço.

12/7/07 19:08  
Anonymous Anônimo said...

Oi, Jean! Que bom ver você por aqui! Achei que você curtiria aquele post que relaciona o Columbo com os cursos de Jornalismo. Pensei: o Jean vai ficar orgulhoso desse tom Christopher Hitchens de se desiludir com o pseudo-marxismo adquirido na coleção O Pensamento Vivo de...

12/7/07 21:05  
Blogger Jean-Philip said...

Não comentei o texto do Columbo-Freire? Tinha adorado. Sempre leio os textos do blog. Se não comento é porque acho que a questão está encerrada e nada do que eu diga vai adicionar algo. Como na música cafona: "não pense que é covardia, é apenas timidez". Por falar em provas com questões de literatura, dia 5 vou pra SP fazer a do Estadão.
Já leu "Dentro da Baleia" do George Orwell?

13/7/07 17:33  
Anonymous Anônimo said...

Wawa weewa!

14/7/07 08:43  
Anonymous Anônimo said...

Jean, não li esse Orwell, aí. E você, leu o Cadeia de Comando, do Seymour Hersh? Parece um complemento interessante ao Looming Towers, embora não tenha o mesmo brilho. Fala de Abu Graib e detona sem dó o povo do Bush - mas não se alarme, não se trata de um Michael Moore. O cara - repórter da New Yorker, também - não tem cor partidária para escarafunchar os presidentes. Já fez uma biografia desatinada do Kennedy, por exemplo.
Benett, você realmente começou o tênis? Ah, esqueci de falar: a piada do cara traumatizado que reencontra o "amigo" no exame de próstata é genial.

14/7/07 10:55  
Blogger Jean-Philip said...

Conheço o Seymour Hersh, mas ainda não li nenhum livro dele, apenas textos. A biografia do Kennedy, pelo que li nos jornais, é cheia de falsificações e erros. Sem contar que escrever uma "história sexual" sobre JFK não é um trabalho sério. Ruim pra ele. Não sei, mas prefiro passar longe de livros assim (não se preocupe, também não compro Ann Coulter...). Achei num sebo um coletânea de textos do NYT que cobrem a queda do Nixon, só coisa da época. Muito interessante.

14/7/07 16:48  
Anonymous Anônimo said...

Para ser bem franco, eu também ainda tenho minhas restrições. Acho que por causa do título panfletário e da condução francamente anti-Bush. Não precisa fazer esse discurso todo, parece Caros Amigos com o Frei Beto na capa ou crônica de certo tipo de aluno do primeiro ano de Jornalismo (aliás, conheço professores que ainda se comportam assim, esperando fechar jornal em mesa de bar!). Enfim, tem boa reportagem ali, pelo menos.

14/7/07 20:59  
Anonymous Anônimo said...

Que bonito os meninos trocando figurinhas :-)

Quem vai me emprestar o livro?

Beijão.

16/7/07 13:59  
Anonymous Anônimo said...

Ah, Alina e Jean: bom mesmo, bom mesmo, bom mesmo é esse Coetzee. O último livro dele, lançado pela Companhia das Letras, é impressionante. "Homem Lento". Vocês talvez não se identifiquem, mas como a idade avança sobre mim...
Vou escrever sobre ele quando terminar. Aí aproveito e chovo no molhado com alguma coisa sobre o "Desonra", desses livros que nos envergonham por tentar escrever.
Alguém aí já leu o "Na Praia", do McEwan?

16/7/07 17:54  
Blogger Katy Mary said...

Victor, nao se preocupe, pois tenho a impressão de que voce não vai acabar como Paul Rayment!

Ainda não li "Na Praia...". Dele só Sábado" - uma excelente leitura, com aquelas descrições "neurológicas" prá lá de minuciosas...

21/7/07 23:10  
Blogger Escritório de Gestão Integrada said...

Oi, Katy! Leia o "Reparação" e "Amsterdam". E aí que o McEwan nos assusta!

23/7/07 02:33  

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